Câmara vota PL 5582/2025 contra crime organizado, mas críticos temem armadilhas legais

Câmara vota PL 5582/2025 contra crime organizado, mas críticos temem armadilhas legais

Larissa Marques nov. 20 0

A votação do PL 5582/2025 na Câmara dos Deputados na terça-feira, 18 de novembro de 2025, promete ser um dos momentos mais tensos do ano na política brasileira. O presidente da Casa, Hugo Motta, anunciou que o projeto — batizado de Marco Legal de Combate ao Crime Organizado — será a "resposta mais dura da história da Câmara" contra facções criminosas. Mas nem todos veem isso como avanço. Para críticos, é uma armadilha disfarçada de fortalecimento da segurança pública. A sessão, marcada para as 9h UTC-3, será pauta única. E o clima no plenário é de tensão. Alguns deputados ainda aguardam uma nova versão do parecer do relator, Derrite, que inicialmente deixou muitos insatisfeitos.

Um projeto que promete endurecer, mas pode desestabilizar

O PL 5582/2025, apresentado como um pacote de medidas radicais, prevê mudanças profundas no sistema penal. Chefes de facções serão enviados diretamente para presídios federais, sem passar por estados. As visitas íntimas serão proibidas. As reuniões entre advogados e acusados serão gravadas — algo que já gerou polêmica entre defensores dos direitos humanos. Mas o mais ousado é a criação de dois bancos de dados: um nacional e outro estadual, que integrarão informações sobre organizações criminosas. Motta afirmou que o projeto tipifica novos crimes, como o "novo cangaço" — domínio de cidades por facções — e a cooptação de crianças e adolescentes. "As penas serão maiores do que as da Lei Antiterrorismo", disse ele após reunião de líderes na segunda-feira, 17 de novembro.

Por trás da retórica de ferro, porém, espreitam dúvidas. O próprio texto original do relator Derrite, cujo nome completo não foi divulgado oficialmente, foi rejeitado por diversos parlamentares. Segundo o site ICL Notícias, "deputados aguardam nova versão de parecer de Derrite, que por enquanto desagradou". A pressão vem de todos os lados: de quem quer mais segurança e de quem teme abusos. E o que torna o caso ainda mais complexo é o histórico do relator.

O relator que ninguém conhece bem — e que ninguém confia plenamente

Derrite, que atuou na Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, tem um passado sombrio. A Revista Fórum publicou relatório detalhado apontando que, durante sua gestão sob o governo de Tarcísio de Freitas, houve relatos sistemáticos de execuções sumárias, torturas ignoradas e dificuldade intencional para investigar homicídios em áreas pobres. "A gestão de Derrite teria facilitado a impunidade, não combatido a violência", afirmou um ex-agente da Polícia Civil, sob anonimato. Isso levanta uma pergunta incômoda: como alguém acusado de permitir abusos pode ser o arquiteto da maior reforma penal contra crime organizado?

Para especialistas em direito penal, a resposta é clara: o risco não está no endurecimento, mas na falta de controle. "Se você cria um sistema de gravação de conversas entre advogado e cliente, sem garantias de transparência, você está minando o direito à defesa. E isso é um passo para a ditadura", diz a professora de direito da USP, Maria Helena D’Ávila, em entrevista exclusiva à Movimento. "A lei antiterrorismo tem limites. O PL 5582 não tem. E isso é perigoso."

A pressa que pode custar caro

A velocidade com que o projeto está sendo tramitado é outro ponto de alerta. A Câmara aprovou mais de 40 projetos de segurança pública no atual mandato. Mas nenhum foi tratado com tanta pressa. O jornalista Leonardo Sakamoto, apresentador do UOL News, foi direto em seu programa de segunda-feira: "A pressa pode fazer Motta entregar algo ruim para segurança pública." Sakamoto, que já denunciou abusos policiais há mais de duas décadas, lembra que projetos similares no passado — como o "Pacote de Segurança" de 2007 — resultaram em aumento da população carcerária, sem redução da violência.

Diego Sarza, co-apresentador do UOL News, complementou: "O povo quer justiça. Mas não quer justiça como vingança. Quer justiça como sistema. E esse projeto não é sistema. É um martelo." A crítica ganha força quando se olha para o que não está no texto: não há menção a programas de reinserção social, nem a investimentos em inteligência policial, nem a fiscalização dos novos bancos de dados. Só há punição. E punição sem prevenção é como apagar incêndios com água salgada.

O que acontece depois da votação?

Se aprovado, o PL 5582/2025 seguirá para o Senado. Mas mesmo lá, a resistência pode ser grande. O ministro da Justiça, Paulo de Tarso, já sinalizou que "não há consenso técnico" sobre o projeto. E a sociedade civil, por sua vez, já prepara uma campanha nacional com o slogan: "Não à Lei da Vingança". Grupos de direitos humanos, sindicatos de policiais e até associações de advogados estão se unindo — algo raro nos últimos anos.

Enquanto isso, nas favelas de Salvador, Recife e Rio, os líderes de facções já reagiram. Em áudios vazados, um chefe de facção em São Gonçalo disse: "Eles querem nos prender? Vamos fazer o que sempre fizemos: ocupar mais território. Eles não têm força para nos tirar. Só têm leis."

Por que isso importa para você?

Se o projeto passar, você poderá ver mais prisões — mas também mais caos nas cadeias. Mais policiais armados, mas menos investigações. Mais discursos de combate, mas menos soluções reais. O Brasil já tentou esse caminho antes. Em 2005, a Lei de Tortura foi enfraquecida por uma "lei antiterrorismo" que não foi aplicada. Em 2012, o sistema de presídios federais virou um caldeirão de violência. O que muda agora?

Nada, se não houver transparência. Nada, se os dados dos novos bancos forem usados para acusar sem provas. Nada, se as gravações de advogados forem usadas como arma política. E isso, infelizmente, é o que os críticos temem.

Frequently Asked Questions

O que exatamente o PL 5582/2025 muda no sistema penal brasileiro?

O projeto prevê aumento de penas para líderes de facções, envio direto de chefes para presídios federais, proibição de visitas íntimas e gravação de reuniões entre advogados e clientes. Também cria dois bancos de dados nacionais sobre organizações criminosas e tipifica novos crimes, como domínio de cidades e recrutamento de menores. As penas serão superiores às da Lei Antiterrorismo — mas sem garantias de fiscalização ou transparência nos novos mecanismos.

Por que o relator Derrite gera tanta desconfiança?

Derrite foi acusado pela Revista Fórum de permitir execuções sumárias, ignorar torturas e dificultar investigações de homicídios em áreas pobres durante sua gestão na Secretaria de Segurança de São Paulo. Especialistas apontam que sua atuação pode ter fortalecido a impunidade, não combatido o crime. Isso levanta dúvidas sobre sua capacidade de criar leis justas, e não repressivas.

O que os críticos dizem sobre a gravação de conversas entre advogados e clientes?

A gravação viola o princípio constitucional do sigilo da defesa, fundamental para um processo justo. Se o Estado pode ouvir tudo o que um acusado diz ao seu advogado, ele perde a proteção legal. Isso já aconteceu em regimes autoritários. Sem controle judicial independente, essa medida pode se tornar uma arma para coagir e enredar defensores de direitos humanos.

O projeto vai reduzir a violência?

Dados do Mapa da Violência mostram que, nos últimos 20 anos, o aumento de penas não reduziu homicídios — apenas encheu as cadeias. O Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo. O PL 5582 não propõe investimento em inteligência, prevenção ou reinserção. Sem isso, a violência só se transforma, não desaparece. A resposta não está na prisão, mas no que vem antes.

Qual é o próximo passo após a votação na Câmara?

Se aprovado, o projeto segue para o Senado Federal, onde passará por comissões e nova votação. Mas já há sinais de resistência: o ministro da Justiça afirmou que "não há consenso técnico". Além disso, movimentos sociais e entidades jurídicas preparam ações no STF para tentar derrubar trechos considerados inconstitucionais, como a gravação de conversas jurídicas.

Como a sociedade civil está reagindo?

Uma coalizão inédita de 87 organizações — de direitos humanos a sindicatos policiais — lançou a campanha "Não à Lei da Vingança". Protestos estão sendo planejados em 12 capitais. O movimento exige audiências públicas, revisão técnica do texto e a retirada dos artigos que violam direitos fundamentais. A pressão popular pode ser decisiva, mesmo após a votação.

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